O surgimento e, sobretudo, a
democratização da internet transformaram o modo como as pessoas enxergam
a vida e lidam com as diferentes realidades socioculturais. Em meio a
uma avalanche de inutilidades que pipocam diariamente no mundo virtual,
aqueles que têm algo relevante a dizer sobressaem – afinal, como já
instituído pelo velho ditado popular: “Em terra de cego, quem tem um
olho é rei”. A filóloga cubana Yoani Sánchez se enquadra na categoria de
personalidades que alcançaram fama internacional em consequência de
suas ideias, postadas no blog “Generación Y” e em seu Twitter.
Considerada símbolo da luta pela
liberdade de expressão, Yoani nasceu em quatro de setembro de 1975 em
uma família de militantes socialistas de Havana. Seu pai, William
Sánchez, trabalhava nas vias-férreas estatais, primeiro como operário,
depois como maquinista. Com o fim da União Soviética e posterior colapso
de todos os regimes comunistas na Europa, no entanto, Cuba passou a não
mais receber recursos externos e a economia local entrou em crise, o
patriarca dos Sánchez então se viu desempregado, como boa parte da
população, e passou a consertar bicicletas.
Já crescida, Yoani Sánchez seguiu seu
interesse por literatura latino-americana contemporânea e formou-se em
Filologia Hispânica na Faculdade de Artes e Letras da Universidade de
Havana. Seu trabalho final, apresentado em 2000, causou polêmica: a
dissertação, chamada “Palavras sob pressão. Um Estudo da Literatura da
Ditadura na América Latina” foi tido como uma provocação ao comparar as
autoridades cubanas aos autoritários caudilhos que ascenderam ao poder
na América do Sul e Espanha do século XX. Paralelamente aos estudos,
Yoani casou-se com o jornalista e dissidente político 28 anos mais
velho, Reinaldo Escobar. Após ter se graduado e se tornado mãe, a cubana
trabalhou em uma editora de livros infantis e como professora de
espanhol para turistas alemães, até emigrar para a Suíça, em 2002, onde
permaneceu por dois anos.
De volta a Havana em 2004 para visitar a
família, Yoani só poderia passar duas semanas no país – segundo a
legislação local, os cidadãos que permanecerem por mais de 11 meses
vivendo no exterior sem uma permissão especial não podem voltar a
residir em Cuba. Para evitar ser obrigada a retornar à Suíça, Yoani
destruiu seu passaporte e pôde novamente residir em sua terra natal,
onde pouco tempo depois ajudou a fundar a revista “Consenso”. Em 2007,
passou a trabalhar como jornalista para o portal “Desde Cuba” e em abril
do mesmo ano criou seu blog, o já mencionado “Generatión Y”.
Em seu primeiro post no blog, feito em
nove de abril de 2007, Yoani descreve a empolgação dos cubanos com as
últimas partidas do campeonato nacional de beisebol e ironiza como a
população se envolve no assunto, em contrapartida à falta de atitude em
relação a outros tópicos: “Os industrialistas se vestem de azul,
enquanto o vermelho é a cor de quem torce pelo Santiago de Cuba. Em
numerosas varandas, portas e muros se lêem cartazes como “Industriais
Campeões” ou “Santiago é muito Santiago”. (…) Sem embargo, não deixo de
notar que durante esses dias a bola nos mergulha em um torpor irreal.
(…) Posso imaginar o que acontecerá se uma vez concluída a final
colocasse em minha varanda um papel mínimo dizendo: “Sim ao etanol” ou
“Internet para todos”. Muito sagaz até nos menores apontamentos, é fácil
entender por que Yoani incomodou o governo de Cuba – e incomodaria,
aliás, a qualquer governo.
O “diário” online de Yoani começou a
ganhar repercussão após a publicação de um artigo da “Reuters” sobre
blogueiros cubanos em outubro de 2007. Logo se seguiram outras matérias,
como a do “Wall Street Journal”, que praticamente elevou a escritora ao
patamar de heroína: “Revolução Cubana: Yoani Sánchez luta contra o
totalitarismo tropical, uma postagem de cada vez”, além de entrevistas
ao “El País”, “Die Zeit” e “The New York Times”.
O blog converteu-se um sucesso
internacional, mas apesar do êxito externo, em Cuba a blogueira parece
só chamar a atenção das autoridades políticas: o site foi tirado do ar
em diversas ocasiões e posteriormente bloqueado em definitivo. Yoani,
que só conseguia atualizá-lo a partir de cafés ou hotéis de luxo (ela
não possui internet em casa), foi obrigada a adotar um novo sistema,
chamado por ela de “rede cidadã”: enviar por e-mail seus textos para que
pessoas fora de Cuba os publiquem.
Em meio a muitas controvérsias, que incluem até o envio de perguntas ao
Presidente americano, Barack Obama, Yoani Sánchez foi eleita uma das 100
pessoas mais importantes do mundo pela revista “Time” e ganhou o prêmio
“Ortega y Gasset”, do jornal “El País”, na categoria de Jornalismo
Digital. No final de 2011, o cineasta brasileiro Dado Galvão
passou três semanas gravando o documentário “Conexão Cuba-Honduras” nos
países homônimos para retratar as restrições políticas impostas às
populações locais. Yoani Sánchez foi uma das escolhidas para
“protagonizar” o projeto, que será lançado no dia 10 de fevereiro deste
ano, e tenta vir ao Brasil para comparecer ao evento. O Ministério das
Relações Exteriores já concedeu o visto à blogueira, resta agora a
autorização do governo cubano. Nesta terça-feira (31.01), a presidente
Dilma Rousseff esteve na ilha, onde se encontrou com o Fidel e Raúl
Castro, mas evitou comentar os pedidos da ativista ou tampouco discutir
questões relacionadas aos direitos humanos. Em entrevista à rádio
“Estadão ESPN”, Yoani Sánchez, que se autodeclara “jornalista
independente”, afirmou estar decepcionada com a líder brasileira.
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